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A poesia é liberta, não tem senhores; é sozinha, ao mesmo tempo multidão. Seu canal é o poeta, por onde passa, arrastando veias, fígado, mãos, olhos, coração.

segunda-feira, 14 de março de 2011

JORGE FERNANDES PARA O DIA DA POESIA


Jorge Fernandes de Oliveira nasceu e morreu em Natal-RN, e forma par com Luís da Câmara Cascudo no que diz respeito à história do movimento modernista no Rio Grande do Norte. Publicou o seu único livro de poemas aos quarenta anos de idade. Antes, publicara em 1909 um livro de contos humorísticos: Contos & Troças e Loucu­ras – contos humorísticos de Jorge Fernandes e versos de Ivo Filho. O poeta modernista do Rio Grande do Norte participara, entre o fim do século XIX e o início do século XX, de vários jornais e revistas, em companhia de “antigos poetas natalenses”, como o popular Ferreira Itajubá (1877-1912). A partir da segunda metade da década de 1920, com a chegada a Natal do ideário modernista, Jorge Fernandes rompeu com as formas tradicionais. Boa parte dos poemas do seu livro são histórias de reminiscências e testemunhos de ruptura com o passado, ao mesmo tempo em que são a construção de uma nova época.

De família tradicional e irmão de intelectuais e homens públicos, Jorge Fernandes não chegou a concluir, no entanto, os estudos. Abandonando logo cedo o Atheneu Norte-Riograndense, passou a trabalhar em uma fábrica de cigarros e foi, também, caixeiro-viajante. Entre os anos de 1920 e de 1930 negociou com bares e “cafés”, até que em 1935 foi nomeado 4º Escriturário do Tesouro do Estado, cargo no qual se aposentou. Segundo Câmara Cascudo, “Sua cultura era um tecido de intuições. Adivinha­va. Lera pouco. Ultimamente, depois de 1925, mais um tanto, mas sem seqüência, siste­máti­ca, disci­plina. Nunca saiu do Rio Grande do Norte. Só lia em Português [FONTE: CASCUDO, Luís da Câmara. Jorge Fernandes. In: FERNANDES, Jorge. Livro de poemas e outras poesias. Natal: Fundação José Augusto, 1970. p. 23-27].

Com edição de 300 exemplares, o Livro de poemas de Jorge Fernandes (1927) foi editado na tipogra­fia do jornal A Imprensa, graças ao apoio de Câmara Cascudo, que se encarregou de apresentá-lo a Manuel Bandeira e a Mário de Andrade, entre outros nomes do movimento modernista. O mesmo Câmara Cascudo apresentou o livro, em posfácio (sob o título Depoimento de Luís da Câmara Cascudo sobre o Livro de poemas de Jorge Fernandes), e também escreveu uma resenha, que publicou no jornal A Imprensa (em 14 de setembro de 1927, sob o título Bric-à-Brac).

Antônio de Alcântara Machado resenhou o livro na Revista de antropofagia (Ano I, n. 1, p. 4, maio, 1928), em tom de admiração pela forma original de poemas que tematizam a vida sertaneja e, ao mesmo tempo, com um senso crítico que percebe a dificuldade de leitura para um leitor do sul do país (devido à presença de vocábulos e expressões regionais).

Mário de Andrade conheceu pessoalmente Jorge Fernandes no dia 07 de agosto de 1927, em passagem por Natal, na volta da sua viagem à Amazônia, embora tenha lido poemas seus a partir do ano de 1925, conforme se pode verificar através de uma carta para Luís da Câmara Cascudo:

Quem é esse Jorge Fernandes, hem? A apresentação de você está engraçadíssima. E o tal de Jorge Fernandes me deixou com água no bico. É bom mesmo. Sensibilidade e inteligência, me parece. [...] “Remanescente” estupendo inteirinho e o último verso é colossal. “Talvez na guerra contra o Paraguai”… que mundo está nesse verso! Que achado formidável.

FONTE: ANDRADE, Mário de. Cartas de Mário de Andrade a Luís da Câmara Cascudo. Belo Horizonte/Rio de Janeiro: Vila Rica, 1991. p. 38. [carta de 6 nov. 1925]

No acervo do Instituto de Estudos Brasileiros–IEB/USP, encontra-se um exemplar do livro que o poeta enviou para Mário de Andrade, com a seguinte dedicatória: “Ao meu grande Mário o meu livro todo errado. 14 Mar. 1928”. Esse livro “todo errado” tivera um projeto de título, conforme narra Marcos Antonio de Moraes:

[...] o que veio a se tornar, em 1927, o “Livro de poemas”, brochura tosca de papel cinzento, impresso na Tipografia d’A Imprensa de Natal, fora antes concebido com o nome de Pensamento Evadido da Cella n. 14 (soneto). “Evadido” foi ainda o substituto de “liberto” que, rasurado pelo próprio poeta, pode ser entrevisto. Ao lado desta indicação na folha contendo datilografado o poema “relógio”, Jorge anota “nome do livro”. Este poema, datado de março de 1926, em cuja folha aparece a intenção primeira do poeta natalense, e outros sete, entre os quais, quatro deles inéditos em livro, foram enviados ao escritor paulista Mário de Andrade [...].


FONTE: MORAES, Marcos Antonio de. Pensamentos evadidos de Jorge Fernandes. O Galo, Natal, nov./1997, n. 11, p. 7-9.


Infelizmente, não existem mais documentos que revelem o desfecho do título definitivo como Livro de poemas de Jorge Fernandes. Ficamos com a certeza de que o poeta acertou no seu título, pois aconteceu a libertação da “cela” através da narração do processo que superou a prática parnasiana: os “pensamentos evadidos” superaram-se nos “poemas parnasianos” e se “concretizaram” nos poemas modernos…

Um comentário:

  1. Como é bom quando se lê um texto embasado e escrito por quem conhece o que está falando. Justifica o motivo do sucesso do blog.

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